Uma vez vi uma campanha falando a
seguinte frase: gente também é bicho. Ela me deixou um pouco fora de mim.
Porque acredito que essa tenha sido a primeira vez que eu tenha compreendido
como encaramos as crianças nas ruas.
Sempre tive o privilégio, graças
a minha maravilhosa mãe, de conviver e conhecer melhor o universo mórbido e
frio que rondam as moradias em calçadas. Sempre soube que independente de onde
se mora, todos somos iguais perante a natureza e Deus.
Fui criada em uma comunidade pequena
onde todos se conhecem. Num lugar onde as crianças podiam brincar tranquilas na
rua, sem que os pais tivessem a preocupação com o perigo da violência, da corrupção
ou da aliciação.
Hoje pouco tempo depois, olho pro
mesmo lugar de sempre, na parada de ônibus e vejo uma criança, conhecida por
todos, vitima de pais irresponsáveis, de uma sociedade apática e da própria violência.
Pequeno pra sua idade, mas enorme
quando o assunto é malandragem. Não porque queira, mas porque não teve outra
escolha. Pois bem, lá está ela, só, suja num banco de terminal. Onde os cachorros dormem. Pessoas passando
constantemente. E nenhuma se quer olhou pra ele.
Então olhei a cena e lembrei-me
da propaganda que havia visto há um tempo. É engraçado como todos se comovem
com um cachorro de rua que está doente, mas uma criança dormindo na rua já é
tão comum que ninguém liga. Mesmo todos conhecendo a sua história, a sua
família, ou a sua ausência...
Lembrei quase que de imediato da
música que diz: eu não sou dono do mundo, mas tenho culpa porque sou filho do
dono. E foi assim que me senti, suja, fria, culpada por não fazer nada.
Crianças não pedem pra vir ao mundo, ela vem através de um adulto que teve a
oportunidade de viver o bastante para gerar uma vida, e se é bom fazê-la porque
não cuidar dela?
Vida não é crime, nem desgraça,
não é culpa, nem maldade. Vida é vida e deve ser respeitada e preservada
independente de cor, raça, crença ou limite no cartão de credito. Toda criança
precisa de cuidado e atenção, se não posso fazer por todas então que eu faça
pelas que eu conheço.
E como diz a campanha: Gente
também é bicho. Não é só bicho que é gente. Pensem nisso e se inquietem, se
angustiem e hajam!